sábado, 15 de fevereiro de 2014

Campanha de doação a condenados “sabota e ridiculariza o cumprimento da pena”, diz Gilmar Mendes

Iuri Dantas 

Ministro do Supremo ironiza e sugere que Delúbio Soares, que arrecadou mais de R$ 600 mil em um dia, use a mesma expertise para recuperar parte dos 100 milhões desviados no esquema do mensalão
Brasília – (atualizado às 23h02) O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, afirmou nesta sexta-feira, 14, em carta enviada ao senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que a arrecadação de doações para ajudar condenados no mensalão a pagar multas fixadas pela Corte “sabota” e “ridiculariza” o cumprimento das penas. Mendes também sugeriu que os petistas façam uma “vaquinha” para devolver “pelo menos parte dos R$ 100 milhões subtraídos dos cofres públicos” pelo esquema do mensalão.

“A falta de transparência na arrecadação desses valores torna ainda mais questionável procedimento que, mediando o pagamento de multa punitiva fixada em sentença de processo criminal, em última análise sabota e ridiculariza o cumprimento da pena – que a Constituição estabelece como individual e intransferível – pelo próprio apenado, fazendo aumentar a sensação de impunidade que tanto prejudica a paz social no País”, disse o ministro na carta.
Num ofício anterior, Suplicy havia cobrado explicações do ministro sobre declarações que levantaram dúvidas sobre o processo de arrecadação de doações. “E se for um fenômeno de lavagem?”, havia perguntado Mendes dias antes. Na quinta-feira, o presidente do PT, Rui Falcão, interpelou judicialmente o ministro para que ele explique as declarações.
“Não sou contrário à solidariedade a apenados. Ao contrário, tenho certeza de que Vossa Excelência liderará o ressarcimento ao erário público das vultosas cifras desviadas – esse, sim, deveria ser imediatamente providenciado”, afirmou Gilmar Mendes, em tom irônico, na carta.
“Quem sabe o ex-tesoureiro Delúbio Soares, com a competência arrecadatória que demonstrou – R$ 600.000,00 em um único dia, verdadeiro e inédito prodígio! –, possa emprestar tal expertise à recuperação de pelo menos parte dos R$ 100 milhões subtraídos dos cofres públicos”, acrescentou o ministro do Supremo, referindo-se ao desempenho da vaquinha do ex-tesoureiro do PT condenado.
Mendes ainda ressaltou o fato de que sites para arrecadação de doações para os condenados foram hospedados no exterior. “Sem subterfúgio que dificultem a fiscalização, como esse de usar sites hospedados no exterior para angariar doações moralmente espúrias, porque destinadas a contornar efeitos de decisão judicial”, afirmou.
Resultados. No processo de arrecadação de doações, Delúbio Soares conseguiu mais de R$ 1 milhão. O ex-deputado José Genoino recebeu mais de R$ 700 mil. Nesta semana foi lançada uma campanha para arrecadar dinheiro para ajudar o ex-ministro José Dirceu a pagar a multa de quase R$ 1 milhão.
Na carta, Gilmar Mendes fez referência a um artigo da Constituição segundo o qual “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. “A pena de multa é intransferível e restrita aos condenados”, disse o ministro. Ainda segundo o magistrado, a falta de transparência na arrecadação torna ainda mais questionável o procedimento.
Mendes disse que é urgente que se tornem públicos todos os dados relativos às doações que favoreceram os condenados pelo STF para que sejam submetidos a análises pela Receita Federal e pelo Ministério Público. Integrantes do Ministério Público, inclusive o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ainda analisam pedidos para que as doações aos condenados sejam investigadas.
Mendes, indicado para o cargo pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de quem foi advogado-geral da União, foi alvo de críticas indiretas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na semana passada.
Nesta sexta, os petistas reproduziram frases semelhantes às ditas por Lula há uma semana. “Os prazos de desincompatibilização e filiação de magistrados para as eleições de outubro estão previstos em lei. Se o ministro quer fazer disputa política ainda dá tempo de se filiar e concorrer. O que não podemos aceitar é que ele continue usando a tribuna do STF para fazer política”, disse o coordenador jurídico do PT, Marco Aurélio Carvalho, que organiza as vaquinhas para os petistas condenados.

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